sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Genoma do feto: pai não é mais necessário

Posted: 12 Jul 2012 08:10 AM PDT
Em junho  a revista Science Translational Medicine publicou artigo sobre uma nova tecnologia capaz de desvendar o genoma de um feto no início da gravidez, sem necessidade de exames invasivos. Bastava  coletar sangue da mãe e saliva do pai. Escrevi sobre isso no texto da semana passada quando discuti Gen ÉTICA e esportes. Quando li esse trabalho já achei uma injustiça que da mãe seria necessário o sangue enquanto do pai só a saliva. E agora nem isso. Pesquisadores americanos acabam de publicar um novo trabalho na revista Nature, segundo o qual é possível sequenciar o genoma do feto sem o DNA do pai. A vantagem, segundo eles, é que nem sempre se consegue amostras do pai biológico.
Como isso é possivel?
Durante a gestação, o sangue da mãe contem uma mistura do seu DNA e do feto que está gerando, pois ele  libera células na circulação materna  durante a gestação. A proporção relativa de sangue fetal aumenta com a idade gestacional. Além disso o feto possui também o DNA do pai. Trocando em miúdos, no sangue da mãe circula o seu  próprio DNA (que não foi transmitido ao feto), o DNA materno transmitido ao feto e o DNA paterno presente no feto. Partindo dessa premissa, da análise do DNA e é claro – de complexos cálculos bioestatísticos -, é possível inferir qual o genoma do feto no sangue da mãe sem necessidade de coletar amostras do pai.
Quais seriam os prós e os contra desse novo método?
Os prós são a possibilidade de diagnosticar inúmeras doenças genéticas sem a necessidade de um exame invasivo. Por que fazê-lo se a interrupção da gestação não é permitida no Brasil me perguntam alguns? Não vou discutir isso aqui. A filosofia é a mesma do ultrasom na gravidez que é recomendado para todas as mulheres. Na grande  maioria dos casos, o objetivo é tranquilizar a gestante. Por outro lado, esse novo método  permitirá diagnosticar precocemente doenças graves e incuráveis ou aquelas onde o tratamento durante a gravidez pode ser muito importante, como por exemplo, a fenilcetonúria. Os futuros  pais têm direito a ter essas informações.
E os contra?
Utilizar essa tecnologia para selecionar embriões com características não associadas com doenças, como por exemplo, habilidade para esportes, como discuti na coluna anterior.
Por outro lado, os autores do trabalho da Nature argumentam que a outra vantagem de não se utilizar o DNA do pai evitaria situações eticamente complicadas de não paternidade que podem chegar a 10%.  Aliás, eu já havia comentado de maneira jocosa que essa era uma possibilidade  antes de conhecer o trabalho da Nature.
Uma nova distorção?  
Se o objetivo dessa tecnologia é diagnosticar precocemente doenças genéticas, ter o DNA do pai pode ser fundamental. Posso imaginar duas situações. A primeira, no caso de suspeita de uma doença recessiva, isto é, onde para ser afetado a pessoa precisa receber um gene defeituoso do pai e outra da mãe. Toda vez que se faz um diagnóstico como esse, é importante verificar se a mãe e o pai são portadores da mutação. É uma ferramenta poderosa para certificar-se que o resultado  do exame genético está correto principalmente em um diagnóstico prénatal quando você não pode examinar pessoalmente o paciente.  A outra situação é quando se encontra uma alteração nova  no feto (que ainda não foi descrita). Como interpretá-la? É patogênica ou não? Se ela não estiver presente nos pais a dúvida continua. Mas descobrir-se que  ela foi herdada da mãe ou do pai é uma informação que pode ser esclarecedora e principalmente tranquilizadora se  eles são  saudáveis. Relatei recentemente um exemplo  que ilustra uma situação como essa.
Em resumo, mesmo com o risco de se descobrir uma falsa paternidade, sou da opinião que ter o DNA do pai em um momento extremamente delicado na vida da gestante, quando a rapidez do diagnóstico ou na interpretação dos resultados deve prevalecer, pode ser  fundamental.
Por Mayana Zatz

Nenhum comentário:

Postar um comentário