quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Bebês normais devem ter seus genomas sequenciados?


Posted: 08 Nov 2012 03:33 PM PST

Na semana passada, a revista Nature publicou o resultado de uma pesquisa internacional mostrando a variabilidade do genoma humano de 1092 pessoas de diferentes etnias. Esses estudos são extremamente importantes para nos ajudar a caracterizar e interpretar a quantidade gigantesca de informações que existe no DNA de cada um de nós. Por outro lado, a divulgação desses resultados e a possibilidade de sequenciar o genoma de uma pessoa a um custo de aproximadamente 1000 dólares vão atrair muitos consumidores curiosos em saber o que está escrito em seus genes. Antes de pagar por isto, é importante saber que o resultado pode proporcionar mais angústias e incertezas do que informações relevantes. Por exemplo, o que adianta saber que temos um risco aumentado para doença de Alzheimer ou Parkinson se não há nada que possamos fazer para evitá-lo? Não é preciso sequenciar o genoma para saber que é importante ter uma alimentação saudável, fazer exercícios físicos e manter a mente ativa. Mas esses exames estão sendo oferecidos por um número cada vez maior de laboratórios e provavelmente a concorrência entre eles poderá baixar ainda mais os custos dessas análises. E consequentemente atrair mais consumidores.

A empresa americana 23 and ME pretende oferecer esse serviço diretamente ao público
Segundo Anne Wojcicki, co-fundadora e diretora da 23 and ME, as informações sobre seu genoma são  suas. “Se você quiser deve ter o direito de obtê-las”. Sem necessidade de uma solicitação médica como é praxe para outros exames laboratoriais. Para o público em geral é muitas vezes difícil avaliar as promessas das ciências médicas oferecidas por firmas comerciais. Foi o que aconteceu por exemplo com os laboratórios que vendem promessas de tratamentos futuros para pais que pagarem para guardar o sangue do cordão umbilical de seus filhos e que provavelmente nunca será usado. Em relação ao sequenciamento do genoma, o que essas firmas não dizem é que interpretar os resultados é extremamente difícil. Uma grande parte do nosso genoma continua sendo um mistério e  a divulgação do projeto ENCODE mostrou que desvendá-lo pode ser ainda mais complicado do que pensávamos. Na prática isso significa que as estimativas de riscos para futuras doenças podem ser muito imprecisas.

Mas o que dizer de testar bebês ou crianças normais?
Essa é uma ideia defendida por Anne Wojcicki, claro que não sem isenção. Ela declarou que quer testar seus filhos para a doença de Parkinson porque seu marido é portador de uma mutação que lhe confere um risco de 80% de vir a desenvolver essa patologia. Portanto seus filhos têm um risco de 50% de herdar essa mutação.
Pergunto: qual é o benefício em saber que eles herdaram o gene para doença de Parkinson, 50 a 60 anos antes de sua possível manifestação? Será que não teremos tratamentos antes disso? E, se na vida adulta eles disserem que não queriam ter sido testados? Que não querem saber enquanto são jovens? Ao testar uma criança estamos tirando-lhe esse direito. A nossa experiência tem mostrado que muitos jovens adultos não querem saber se terão doenças de início tardio ainda sem tratamento.

Variantes associadas a um possível retardo mental
Lembro-me também do caso de um cientista famoso, reconhecidamente muito inteligente, que ao sequenciar seu genoma contou que descobriram que ele tinha uma variante que havia sido previamente associada a um retardamento mental importante. Foi motivo de riso em todos os presentes. Mas imaginem se essa variante estivesse presente em uma criança, ou em um caso de diagnóstico pré-natal? Qual seria o impacto dessa informação?

A variante ApoE4 aumenta o risco de desenvolver a doença de Alzheimer (DA)
A DA obedece a uma herança complexa ou multifatorial com interação de fatores genéticos e ambientais. Quem possui a variante ApoE4 tem um risco aumentado de vir a desenvolver essa patologia embora a sua presença não é determinística. É mais um teste que condeno que seja feito em crianças. Mas novamente essa não é a opinião de Anne Wojcicki. Seu argumento é que quem tem a variante tem maior risco de desenvolver a doença se sofrer traumas cerebrais. Então, segundo ela, se você souber que seu filho tem a variante deve evitar que faça esportes que aumentem o risco de traumatismo craniano como futebol americano, ou luta de box, por exemplo. Ou insistir para que ele use sempre um capacete. Ora, será que é preciso ter a variante APOE4 para tomar todos os cuidados possíveis para prevenir traumatismos cranianos em seus filhos?
E você caro leitor? O que acha? Pretende sequenciar o genoma de seus filhos?

Por Mayana Zatz

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